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Grandes Ecologistas

Rachel Carson

50 anos do livro Primavera Silenciosa: um tributo à Rachel Carson
Roseli Ribeiro, do site Observatório Eco

Nas páginas da prestigiada revista americana, The New Yorker, a denúncia ambiental, sobre o uso de pesticidas que poluía o meio ambiente americano, revelada sob o título “Primavera Silenciosa”, surgiu ao mundo em junho de 1962. Após ganhar repercussão no país recebeu seu formato em livro, publicado em setembro daquele ano.

Para denunciar a poluição ambiental provocada pelo uso indiscriminado de pesticidas nos campos americanos Raquel Carson realizou extensa pesquisa científica e conversou com dezenas de especialistas. Em seu livro, ela conta que já em 1945 conhecia os efeitos desta poluição, porém em 1958 ao receber a carta de uma mulher relatando a devastação de uma região, Carson, embora, gravemente doente, reuniu forças para escrever sobre o tema. Vale lembrar que naquela época, graças à sua sólida carreira como bióloga marinha e por ter escrito o livro “O mar que nos cerca”, Carson já era conhecida do grande público americano.

Na década de 50, nos EUA, muitos cientistas sabiam dos malefícios do DDT usado para eliminar as pragas na agricultura, contudo, antes de Carson esse assunto não havia sido levado ao grande público. Ela por mais de 4 anos realizou uma extensa investigação sobre o tema e sistematizou sua criteriosa pesquisa. Em seu trabalho soube mostrar ao público que não estava acostumado aos termos científicos a relação de causa e efeito que o uso indiscriminado de pesticidas provoca nas plantas, águas, animais e homens.

No livro, a cientista lançou os princípios do que significa a ecologia e de que forma a vida na Terra está conectada a cada elemento. Podemos dizer que graças à Carson, o conceito de ecologia ganhou prestígio. Mas ela foi além, escreveu sobre o direito moral de cada cidadão saber o que estava sendo lançado de forma irresponsável na natureza pela indústria química. E foi mais além, despertou a consciência ambiental de uma nação para reagir e exigir explicações e soluções. 



Carson se importava verdadeiramente com a contaminação provocada pelo uso do DDT e a relação direta com a destruição do meio ambiente, cunhou a expressão de que os inseticidas deveriam ser taxados de “biocidas”. Ela relatou minuciosamente diversos casos de degradação ambiental em seu trabalho. Coletou dados precisos, colheu depoimentos e usou seu talento literário para descrever todo o problema ambiental de modo a sensibilizar as pessoas. Os leitores precisavam, não apenas, compreender a dimensão da contaminação. Deveriam ir além, e exigir soluções do governo e das indústrias, “a população precisa decidir se deseja continuar no caminho atual, e só poderá fazê-lo quando estiver em plena posse dos fatos”, alertou em seu livro. 

Este foi o legado de Rachel Carson, ela não se contentou em apenas relatar objetivamente os fatos, ela lançou sua posição em prol da causa ambiental. Não bastava apenas o público conhecer os efeitos do DDT. Para a autora, os leitores precisavam decidir se queriam continuar convivendo com aquela poluição, e para decidir o cidadão precisaria ter “plena posse dos fatos”, na avaliação da cientista.

Após a publicação do texto na revista The New Yorker, o presidente do EUA na época, John F. Kennedy determinou que o uso do DDT fosse investigado. A rede de televisão CBS realizou um documentário sobre os fatos revelados por Carson. Com isso, a mensagem dela alcançou mais pessoas, permitindo que a mobilização em torno do problema chegasse ao Senado Federal, no qual a escritora em 1963 prestou depoimento aos senadores sobre os efeitos nocivos da contaminação pelo produto. 

Nos Estados Unidos, após a investigação conduzida pelo governo a produção caseira do veneno foi proibida. A criação de leis estaduais e federais ganhou impulso e culminou após alguns anos com a criação no Congresso Nacional da Lei de Política Nacional Ambiental que instituiu a EPA (Agência de Proteção Ambiental). Posteriormente, surgiu uma legislação que garantisse proteção às espécies ameaçadas de extinção. Rachel Carson morreu em 1964, aos 56 anos, vítima de um câncer de mama, doença contra a qual já lutava há vários anos.

A importância do livro Primavera Silenciosa

Michel Frome, ambientalista americano, jornalista e professor, também não esconde a influência e a importância do livro de Carson. Frome desenvolveu nos Estados Unidos, pioneiramente, o programa de jornalismo e redação ambiental da Universidade de Western Washington em Billingham (Washington). Aposentou-se em 1995 e no ano seguinte escreveu “Green Ink: uma introdução ao jornalismo ambiental”, livro considerado fundamental para qualquer curso de jornalismo ambiental. Em 2008, foi traduzido e publicado no Brasil.

Ao abordar a importância de Rachel Carson no jornalismo ambiental, Frome afirma não conseguir pensar em um exemplo melhor de jornalista ambiental, embora reconheça que ela – Carson – jamais teria se considerado uma.

Segundo Frome, ela foi ridicularizada pela indústria de pesticidas que gastou meio milhão de dólares para jogar na lama as denúncias inseridas em “Primavera Silenciosa”. Muitas das conquistas ambientais, que nasceram graças ao seu trabalho, ela não chegou a presenciar.

Em 2000, “Primavera Silenciosa” foi considerada pela Escola de Jornalismo de Nova York uma das maiores reportagens investigativa do século XX. Em 2006, o jornal britânico, The Guardian colocou o nome de Rachel Carson em primeiro lugar na lista das cem pessoas que mais contribuíram para a defesa do meio ambiente.

Outro professor americano, Dale Jamieson no livro “Ética e meio ambiente: uma introdução”, também revela sua admiração à Rachel Carson quando afirma que ela é o tipo de escritora e pensadora que leva as pessoas a agirem, e que nesse sentido pode ser considerada um ícone do movimento ambientalista contemporâneo. 

Exemplo de engajamento ecológico

A obra, “Primavera Silenciosa”, conseguiu mostrar todos os aspectos da contaminação provocada pelo veneno DDT, com base em fatos científicos e apoiado em extensa pesquisa e na opinião de balizados técnicos da época.

Carson sistematizou todas as informações em linguagem acessível ao grande público. Ela transmitiu as bases dos conceitos modernos de ecologia, do princípio da prevenção, ao afirmar que os venenos não poderiam ser lançados na natureza, sem que se soubessem antes os reais efeitos desta prática nos organismos vivos.

Ela argumentou sobre as bases do direito de informação do cidadão sobre as contaminações. Ela lançou a tese de que se o cidadão deve suportar a poluição ele também tem o direito de exigir reparações e providências para a cessação das práticas contaminadoras.

Além disso, Carson demonstrou preocupação genuína sobre os fatos que relatava, usou seu talento literário para envolver e ensinar seus leitores. Escreveu com sentimento pensando nas gerações futuras. O desavisado leitor, que, por exemplo, ler a primeira página que singelamente começa com a frase: “Era uma vez uma cidade no coração dos Estados Unidos onde todos os seres pareciam estar em harmonia com o seu ambiente”, jamais irá supor o resultado desta “fábula para o amanhã”.

Em seu livro, Michel Frome cita uma carta que Carson escreveu para um amigo, na qual ela afirma “Mas agora posso crer que pelo menos ajudei um pouco. Seria irrealista se acreditasse que um único livro causaria uma mudança completa”. “Poderia ser irrealista, mas a história comprovou ser verdadeiro”, disse o editor de Carson, Paul Brooks, em seu livro “Speaking for nature: how literary naturalists from Henry Thoreau to Rachel Carson”. 

“Primavera Silenciosa” mostra que é possível produzir jornalismo ambiental sério e de repercussão positiva, livre de aspectos político-partidários e comerciais, mas com uma postura em favor da vida. O que é necessário? Coragem, criatividade e se importar verdadeiramente com o sagrado direito à vida.
Fonte:

O Espírito de Rachel Carson
Terry Tempest Williams
Escritora, naturalista e ativista ambiental.
Da revista Eco-21 

Havia uma vez uma cidade no coração da América onde toda vida parecia viver em harmonia com seu ambiente. (...) Então uma estranha influência maligna se arrastou sobre a área e tudo começou a mudar. Algum encanto maligno havia se estabelecido na comunidade: misteriosas enfermidades eliminaram os bandos de galinhas; o gado e as ovelhas adoeceram e morreram. Por todo lugar havia uma sombra de morte. Os fazendeiros falavam de muita doença entre seus familiares. (...) Havia uma estranha calma. Os pássaros, por exemplo – onde tinham ido? Era uma primavera sem vozes. (...) Nenhuma feitiçaria, nenhuma ação inimiga havia silenciado o renascimento de nova vida no mundo afetado. As próprias pessoas haviam feito isso.

De “Uma Fábula para o Amanhã” de Rachel Carson

Quase 50 anos após o lançamento de Primavera Silenciosa, sua mensagem feraz e compassiva ainda vive. Rachel Carson. Ouvi seu nome pela primeira vez de minha avó. Eu deveria ter sete ou oito anos de idade. Estávamos observando pássaros – pintassilgos e outros – no jardim dos meus avós. “Imagina um mundo sem pássaros”, disse minha avó. “Imagina acordar sem o canto dos pássaros”. Eu não conseguia. “Rachel Carson” lembro-me dela dizendo: “Primavera Silenciosa”. E então ela e meu avô se engajaram numa discussão mais profunda enquanto minha mente tentava compreender o que minha avó havia acabado de dizer.


Charge de David Levine

Trinta anos depois, me encontrava num sebo de livros usados, em Salt Lake City. A lombada verde de Primavera Silenciosa me chamou a atenção. Eu puxei o clássico da estante e o abri. Primeira edição, 1962. Enquanto releio o texto, surpreende-me quão pouco mudou o livro: “Um dos exemplos mais trágicos de nosso ataque não pensado à paisagem está à vista nas terras de Artemísia do Oeste, onde uma vasta campanha está acontecendo para destruir a salva e substituir os pastos. Se uma empresa já precisou ser iluminada com um senso de história e significado da paisagem, é essa. (...) Ela está espalhada diante de nós como as páginas de um livro aberto no qual podemos ler por que a terra é o que é, e por que devemos preservar sua integridade. Mas as páginas jazem não lidas”. Ainda as páginas jazem não lidas. Com o Primavera Silenciosa nas mãos, eu me pergunto quantos de nós dentro da comunidade da área de conservação realmente já o lemos. Conhecemos o livro. Podemos falar de memória um resumo de duas frases de seu texto: “Toda vida é interligada. Os agrotóxicos entram na cadeia alimentar e não só ameaçam, mas destroem um meio ambiente saudável...”. E, no entanto, podemos ter perdido a riqueza da prosa.

Comprei o livro, o levei para casa, e o leio e releio de capa a capa. As palavras se tornam um sacramento honrando o corpo da Terra. Frágil. Delicado. Equilibrado. Em exemplo após exemplo, Rachel Carson tece um conto ambiental de amor e vida e perda. Andorinhas voando. Andorinhas mortas. Peixes nadando. Peixes de barriga para cima. O mundo envenenado que ela registra não é um mundo no qual eu gostaria de viver. Continuo lembrando a mim mesma que isso não é ficção – nem em 1962, nem agora. E eu me pergunto, o quanto mudou? Com cada capítulo identificando os horrores de agrotóxicos e hidrocarbonetos, a teia de vida que eles estão desemaranhando, estou atenta à resistência emocional e intelectual de Rachel Carson, sua habilidade de aguentar a dor da história que ela estava contando. Rachel Carson era uma mulher fervorosa. Uma alma gentil, direcionada, que acreditava na eloquência dos fatos. Ela amava tanto a linguagem quanto a paisagem. “Não consigo me lembrar de nenhuma época em que não estava interessada no lado de fora e em todo o mundo da natureza”, disse Carson. 

Escrever se tornou expressão de seu amor ao mundo natural. Ela publicou sua primeira história quando tinha 10 anos de idade, ganhando a Medalha de Prata da Saint Nicholas, uma revista infantil de grande prestígio. “Talvez aquela precoce experiência de ver meu trabalho impresso representou seu papel na nutrição do meu sonho de infância de me tornar uma escritora”, disse ela. Aqui estava uma jovem mulher já no seu caminho. Em 1928, ela se graduou magna Cum Laude na Faculdade da Pensilvânia para Mulheres (agora a Faculdade Chatham), com formação em zoologia. A força de seu curso de trabalho tanto na literatura quanto na ciência fornece evidência de sua dupla natureza – cientista e escritora. “Eu pensei que tinha que ser ou uma ou outra”, ela disse. “Nunca me ocorreu que eu deveria combinar as duas carreiras”.

Paul Brooks, editor e biógrafo de Rachel Carson, escreveu sobre ela: “A fundição dessas duas poderosas correntes – a imaginação e o discernimento de um criativo escritor com a paixão por fatos de um cientista – vai longe para explicar a mistura de beleza e autoridade que fazia seus livros serem únicos”. Ver o mundo como um todo – esse é talvez o maior presente de Rachel Carson para nós. Ela continuou sua educação como bióloga, recebendo um mestrado em zoologia na Universidade John Hopkins, onde estudou genética. Sua tese “O desenvolvimento do prônefro durante a vida embrionária e o início da vida larval do peixe-gato (Ictalurus punctatus)”, deveria suprimir a frequente crítica de que Rachel Carson era somente uma naturalista “amadora”.

Em 1936, ela aceitou um trabalho como bióloga marinha no Departamento Americano de Pesca (que mais tarde se tornou o Serviço Americano de Peixes e Animais Selvagens). Ali ela era capaz de fundir graciosamente seus talentos como cientista e como escritora, eventualmente se tornando chefe de publicações para o Departamento. No início de sua posse continuou lecionando cursos na Universidade de Maryland e na John Hopkins.

“Sob o vento marinho” foi publicado em 1941. “O mar ao nosso redor” foi publicado em 1951 e recebeu o Prêmio Nacional do Livro. “Se há poesia no meu livro sobre o mar”, ela disse, “não é porque eu deliberadamente a coloquei lá, mas porque ninguém podia verdadeiramente escrever sobre o mar e deixar de fora a poesia”. Quatro anos depois, em 1955, ela publicou “A Borda do Mar”, estendendo o mundo de seus leitores à intrincada vida das marés. Rachel Carson tinha se tornado uma autora estimada pelo público estadunidense. E então veio o Primavera Silenciosa.

Carson recebeu uma carta urgente de sua amiga Olga Owens Huckins, uma jornalista, que lhe pediu ajuda para achar pessoas que poderiam elucidar e falar sobre os perigos dos agrotóxicos. Os Huckins tinham uma pequena casa em Duxbury, Massachusetts, logo ao Norte de Cabo Cod, que eles haviam transformado num santuário para pássaros. Sem qualquer pensamento sobre os efeitos nos pássaros e animais selvagens, o Estado havia pulverizado toda a área para o controle de mosquitos. Olga Huckins mandou uma carta indignada ao Boston Herald em Janeiro de 1958. Um trecho: “O avião do controle de mosquitos voou sobre nossa pequena cidade no verão passado. Já que vivemos perto dos pântanos, fomos tratados com várias doses letais enquanto o piloto cruzava nossa região. E nós consideramos a pulverização de veneno ativo sobre terra privada uma séria intrusão aérea”. O “inofensivo” banho de chuveiro logo de uma vez matou sete de nossos amáveis pássaros canoros. Nós recolhemos três corpos mortos na manhã seguinte, bem na nossa porta. Eles eram pássaros que haviam vivido junto a nós, haviam confiado em nós, e construído seus ninhos em nossas árvores ano após ano. No dia seguinte, três deles estavam espalhados ao redor do bebedouro (eu o havia esvaziado e lavado após a pulverização, mas você nunca consegue matar DDT). (...) Todos esses pássaros morreram horrivelmente e da mesma maneira. Seus bicos estavam escancarados, e suas garras oblíquas estavam erguidas aos seus peitos, em agonia.

Olga Owens Huckins testemunhou. Rachel Carson respondeu. Quatro anos e meio depois foi publicado Primavera Silenciosa. Carson escreveu para Huckins dizendo que foi sua carta que havia “começado tudo” e a havia levado a perceber que “eu devo escrever o livro”. Uma correspondência entre duas amigas. Duas mulheres. Indivíduos defendendo os lugares que amam. Nunca podemos esquecer o poder de vozes fervorosas, informadas, contando sua história, testemunhando, manifestando-se em nome da terra.

Rachel Carson disse a verdade como ela a via. O mundo natural estava morrendo, envenenado pelas mãos da cobiça corporativa. Suas palavras se tornaram um catalisador para a mudança. Um debate havia começado: uma reverência à vida versus uma reverência ao poder. Através da força e da vitalidade de sua voz, Carson alterou o panorama político dos Estados Unidos. Loren Eisely escreveu que o Primavera Silenciosa “é um ataque devastador, severamente documentado, e implacável, sobre a falta de cuidado, a cobiça e a responsabilidade humana”. Nem todo mundo o via assim.

A empresa química Monsanto, se antecipando à publicação do Primavera Silenciosa, encomendou urgentemente uma paródia intitulada “O Ano Desolado”, para agir contra o ataque de Carson à indústria. Sua intenção era mostrar a pestilência e a fome que a companhia alegava que ocorreria num mundo sem agrotóxicos. Em seu boletim semanal, a Associação Médica Americana disse ao público como obter um “kit informativo”, compilado pela Associação Nacional de Químicos Agrícolas, para responder perguntas provocadas pelo Primavera Silenciosa. A revista Time chamou o Primavera Silenciosa de “injusto, unilateral e histericamente superenfático”, acusou Carson de assustar o público com “palavras atiçadoras de emoções”, e alegou que seu texto estava “simplificado demais e totalmente cheio de erros”. Solteirona. Comunista. Uma naturalista amadora que deveria apegar-se à poesia, não à política. Esses eram só alguns dos rótulos usados pra desacreditá-la. Rachel Carson, na verdade, havia tocado fogo no universo químico da América.

O Presidente John F. Kennedy viu as chamas. Ele tomou conhecimento do Primavera Silenciosa quando apareceu nas páginas do New Yorker. Numa coletiva com a imprensa, em 29 de Agosto de 1962, um repórter perguntou a Kennedy sobre a crescente preocupação entre os cientistas sobre os perigosos efeitos colaterais em longo prazo do uso de DDT e outros pesticidas e se o Departamento Americano de Agricultura ou o Serviço Americano de Saúde Pública estavam planejando ou não lançar uma investigação a respeito.

“Sim”, replicou o Presidente: “eu acho que particularmente, é claro, desde o livro da Srta. Carson”.

A mensagem de Rachel Carson havia infiltrado a ralé. O Painel das Ciências da Vida do Comitê de Aconselhamento Científico do Presidente foi encarregado de revisar o uso dos pesticidas. Em 1963, o Comitê emitiu um chamado para medidas legislativas para salvaguardar a saúde da terra e de suas pessoas contra pesticidas e toxinas industriais. O relatório do Presidente havia vindicado Carson. Suas poesias foram transformadas em política pública. Em 1967, cinco anos após a publicação do Primavera Silenciosa, o Fundo de Defesa do Meio Ambiente nasceu, com um mandato, nas palavras de um de seus fundadores, “para construir um corpo de Lei criada por precedência para estabelecer o direito de um cidadão a um meio ambiente limpo”. Três anos depois, em 1970, foi criada a Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency - EPA).

E hoje nós temos uma nova geração de indivíduos carregando a tocha da vigilância. Pessoas como Lois Gibbs, a mulher que expôs o “Canal do Amor” ao público estadunidense como um tenebroso exemplo da arrogância e descuido da indústria quanto à saúde da comunidade. E Mary O’Brien, cientista da Aliança Mundial pela Lei Ambiental, que fornece dados científicos a advogados e cidadãos de zonas rurais, lutando para manter a integridade biológica de suas comunidades. E Pam Zahoran da Proteger o Meio Ambiente e as Crianças em Toda Parte, que assinou, junto com 22.000 outros cidadãos, uma petição contra um grande incinerador de resíduos perigosos a ser construído pelas Indústrias Waste Technologies em East Liverpool, Ohio. Elas nos mostraram o que significa cidadania responsável. Como Carson, esses indivíduos estão pegando os fatos e abastecendo-os com uma resistência veemente.

Rachel Carson nos lembra o que significa ser um guerreiro de coração: “Não, eu mesma nunca pensei que os fatos desagradáveis dominariam, e espero que não dominem. A beleza do mundo vivo, que eu estava tentando salvar, esteve sempre predominante em minha mente – isso, e a raiva às coisas sem sentido, brutais, que estavam sendo feitas. Sentia-me compelida a uma obrigação solene de fazer o que eu pudesse – se pelo menos não tentasse, nunca poderia estar feliz de novo na natureza”.

Não muito tempo atrás, visitei o Refúgio Nacional de Animais Selvagens Rachel Carson, um rico pântano de sal que se espalha em aproximadamente 1.900 hectares ao longo de 73 quilômetros na costa do Sul do Maine. Carson conhecia muito bem essa região. Enquanto eu andava através do santuário e escutava a límpida canção de melros de asa vermelha e assistia o vôo deliberado de grandiosas garças azuis, não podia evitar me perguntar, se Carson estivesse viva hoje, ela acharia esse mundo um pouco mais quieto? Eu teria adorado perguntar-lhe que preço ela pagou, pessoalmente, por sua condição de ser uma guerreira, no que se diz respeito ao Primavera Silenciosa. Posso imaginá-la olhando diretamente dentro de meus olhos e sorrindo sobre tal presunçosa pergunta, balançando a cabeça, e então olhando para fora, em direção ao seu amado mar. Eu a imagino dizendo “que escolha nós temos?”. 

Rachel Carson morreu de câncer de mama no dia 14 de Abril de 1964, aos 54 anos de idade. Antes de sua morte ela escreveu, “É bom saber que eu devo continuar vivendo mesmo nas mentes de muitos que não me conhecem e, grandemente, através de associação com coisas que são bonitas e amáveis”.

Agora quero lembrar o espírito de Rachel Carson. Quero ser tão feroz quanto compassiva ao mesmo tempo. Quero carregar uma raiva saudável dentro de mim e despedaçar a complacência que vazou para dentro de nossa sociedade. Quero conhecer a graça de coisas selvagens que sustenta a coragem. O escritor Jack Turner clama por uma “fúria sagrada”, uma fúria que está fundamentada no conhecimento sagrado de que toda a vida é relacionada. Podemos achar a coragem moral e a fúria sagrada dentro de nós mesmos para darmos um passo à frente e questionarmos cada Lei, pessoa e prática que nega justiça à natureza? Podemos continuar a testemunhar? Essa é a mensagem do Primavera Silenciosa. Carson nos diz, “A história da vida na Terra tem sido uma história de interação entre coisas vivas e seus ambientes”. 

Rachel Carson era uma mulher destemida: “Não tenho medo de acharem que sou uma sentimentalista quando digo que acredito que a beleza natural tem um lugar necessário no desenvolvimento espiritual de qualquer indivíduo ou qualquer sociedade. Acredito que sempre que destruímos a beleza, ou sempre que substituímos alguma coisa feita artificialmente pelo homem por uma característica natural da Terra, nós retardamos alguma parte do crescimento espiritual do homem...”.

Penso na minha avó. Penso nos pássaros. E penso naquela “cidade no coração dos Estados Unidos onde toda a vida parece viver em harmonia com seu ambiente...”. Percebo a inocência daqueles dias. Agora, a idéia de uma primavera sem cantos dos pássaros é de fato inimaginável. Rachel Carson nos convocou a agir. Suas palavras permanecem como um texto sagrado.






Miguel Abellá

Nome esquecido, mas foi um dos homens mais importantes da história do ambientalismo brasileiro. Uma dica aos pesquisadores em meio ambiente e educação ambiental no Brasil: sugiro, antes de se falar em grandes conferências de ONU sobre meio ambiente, e afirmar que foram essas conferências que divulgaram a questão ambiental, falar sobre aqueles e aquelas que muito tempo antes já falavam abertamente sobre meio ambiente. Miguel Abellá é um nome esquecido, e isso é um equívoco muito grande por parte de muitos daqueles que abordam a educação ambiental no Brasil.
A primeira parte é um trecho de minha dissertação de mestrado - tanto que as referências bibliográficas podem ser encontradas lá - e o segundo trecho é do site do IPEH (Instituto de Pesquisas em Ecologia Humana)

www.ipeh.org.br

Artista plástico morador de São Paulo ficou conhecido nos anos 70 por fazer manifestos solitários e  silenciosos na grande metrópole paulistana, ao sair nas ruas fantasiado com uma máscara de proteção de gás e com cartazes e escritos: “ABAIXO A POLUIÇÃO!” 

Depois de ter passado muitos anos protestando contra o regime de Franco através de pinturas e poemas, foi para a Argentina em 1950 e para São Paulo em 1964. Protestou contra o plástico; contra o acordo nuclear Brasil-Alemanha; contra a exploração de madeira na Amazônia; contra a poluição de Cubatão e do sistema Tietê- Billings; contra o fim de Sete Quedas. Geralmente declarava seu amor aos animais e ao rio São Francisco:

Humanidade. Exerço a liberdade de protesto pela Carta das Nações Unidas pelo Direito dos Homens e pela Constituição Brasileira. Não resisto suportar esse mundo de ratos no seu esgoto, sem esse gesto de dignidade contra a abjeção submissa de uma sociedade fatalista, condenada e sem futuro. Onde está o homem, Diógenes? 
(ABELLÁ apud MARQUES, 2000)

Fundador do Movimento Arte e Pensamento Ecológico conseguiu uma legião de colaboradores entre artistas e ecologistas. Assim como Lutzenberger, suas críticas e observações continham um grande teor libertário e acreditava que a sociedade deveria lutar contra o fatalismo dos abusos tecnológicos, que deveriam ser civilizados em seus excessos.Ao ser punido por um professor com um bofetão, em sua adolescência na Espanha, por  não entender geometria e matemática, questionou a educação e a sociedade de maneira radical: 

“Naquele momento, desmistifiquei a autoridade, senti que a civilização, o progresso, a autoridade, esses conceitos tinham que ser revisados...” (URBAN, 2001, p. 74)

A revista “Pensamento Ecológico”, fundada pelo grupo, em seu primeiro número, mostrava no editorial o teor crítico e libertário de Abellá, ao discutir o modelo de desenvolvimento que era adotado no Brasil – com intenso consumo de combustíveis fósseis e energia atômica – e também retomava um debate caro aos libertários, que eram as soluções ao nível de pequenas comunidades.

Seus componentes criticavam também os padrões de consumo que eram trazidos pelas grandes empresas transnacionais e o conseqüente desenvolvimento da cultura de massas e da centralização – e concentração de poder – administrativa, econômica e política. Abellá pôs em dúvida, já na conferência Rio-92, o conceito de desenvolvimento sustentável do Relatório Brundtland, que foi enormemente divulgado durante a conferência, já que o julgava apenas mais uma forma de os países hegemônicos explorarem os do terceiro mundo, impondo-lhes noções, conceitos e exigências.

E algumas vezes, já no fim de sua vida, também como Lutzenberger, demonstrava um tom catastrófico em sua fala, ao perceber que a exploração dos recursos naturais e a despreocupação em relação ao meio ambiente estavam se acelerando:

Nosso progresso é unilateral, não é dimensional, não é verdadeiramente holístico. Para mim, assistimos ao fim da civilização. Sem ecologia humana, nem a ecologia biológica se salvará. (Ibidem, p. 75) 

Assim também como já aparentava grande desânimo em relação ao movimento ecológico brasileiro, o qual havia, em boa parte, se institucionalizado e perdido a noção de ação direta nas ruas:

Hoje, o movimento se fechou em capelinhas... os meios, o dinheiro, o poder, a tecnologia, se converteram em finalidades, e as finalidades não existem mais... falta a emoção da rua, a gente perdeu essa emoção porque os interesses econômicos são prioritários para os indivíduos da cidade moderna. (ABELLÁ, 2000, p. 130) 


www.ipeh.org.br

Emílio Miguel Abellá é o nome de um dos mais importantes ambientalistas que São Paulo já teve a honra de hospedar.
Artista plástico espanhol, chegou à cidade em 1964, trazendo na bagagem, além do talento como artista, a convicção contundente da importância da militância ambientalista.
Foi ele o protagonista de um dos mais famosos manifestos da história da metrópole quando, em 1973, vestido com um saiote e usando uma máscara de oxigênio, saiu pelas ruas com uma placa contendo reportagens sobre a poluição do ar em São Paulo. E isso não foi o começo. Já havia lançado as campanhas performáticas contra os contratos de risco para a exploração madeireira da Amazônia nos anos 70, contra a poluição de Cubatão e do Tietê-Billings e contra o fim das Sete Quedas. E as manifestações não pararam mais.
Fundador do Movimento Arte e Pensamento Ecológico, nos últimos tempos de vida, distribuía a todos uma simples folha verde de plástico, sorrindo e provocando: "guarde bem esta recordação do que estamos perdendo para sempre".
Morreu em junho de 2000, em São Paulo, e sua ausência comprometeu inevitavelmente o brilho das manifestações em defesa do meio ambiente desde então..
Patrono e um dos fundadores do IPEH, Abellá é mais que uma referência. É um símbolo do movimento ambientalista paulistano.

Confira a entrevista dada por Abellá à Revista Aldeia, publicada na edição de abril/maio de 2000.

"Eu concordo com Carlile, quando diz que a alma de todos os progressos é o progresso da alma"

Por Francisco da Silva e Nelson Pedroso*

Aldeia - o senhor chegou ao Brasil em 1964, e, após três meses, houve o golpe militar. Como ficou o ecologista, o pacifista, em pleno regime militar? O que o levou a sair às ruas do centro de São Paulo, fazendo o seu famoso protesto solitário?

Abellá - Em agosto de 1973, a poluição chegou a um tal nível na cidade que as rádios recomendaram à população se provir de colírios e evitar sair à rua com carro, porque a poluição podia até matar. A inversão térmica estava prevista para tida aquela semana. Eu disse: Chegou o meu dia. Agora eu vou demonstrar perante 10 milhões de testemunhas como o progresso é muito problemático, muito questionável. Eu concordo com Carlile quando diz que a alma de todos os progressos é o progresso da alma. Aos doze anos eu já falei que ia revisar o progresso, quando recebi um bofetão de um professor. Abaixei a cabeça, não de vergonha, mas de rebeldia. Então, naquele dia, em 1973, eu pensei: vou sair, vou criar um movimento, vou sair com uma máscara para combater a poluição, a ditadura tecnológica, dando um sinal às pessoas para que vissem também que se tratava de uma ditadura militar. Queria propor uma reavaliação de todo esse processo que, ao invés de levar o homem para o destino ao qual estava designado, o leva para o caos.

Aldeia - O que é a Ecologia Humana defendida por Abellá?

Abellá - Quando se fala em Ecologia, as pessoas só se preocupam com duas questões, a fauna e a flora. A sensibilidade planetária que eu vislumbro, no entanto, vai muito além desses dois fatores. O equilíbrio da natureza não se limita a eles. Em todo conflito, de qualquer ordem que seja, existem o agente ativo e o agente passivo. Com o agente ativo não nos preocupamos nunca, só com o agente passivo, a biosfera. E o culpado pela crise da biosfera quem é? Ela é provocada pela noosfera, a parte inteligente da terra. Então, não fazemos mais que transferir para a biosfera a parte crítica, insustentável, desequilibrada, caótica, apocalíptica, que é a noosfera. Nunca se enfocou esta parte, e esta é a preocupação da Ecologia Humana. Devemos considerar o Homem como o responsável pela crise e responsável também pela saída da crise. Veja você, a criação parece ser mais inteligente que o ser humano. A criação evoluiu de tal maneira, em suas diferentes etapas: mineral, vegetal, animal, vida racional, e colocou o ser humano no vértice da pirâmide e agora ele, do vértice, condena toda a pirâmide: a bomba atômica, a camada de ozônio, a água potável e a não potável, as florestas, as áreas cultiváveis, o ar nas grandes concentrações humanas onde vive mais de 60% da população humana. Globalmente, tudo caminha para a degradação. A natureza segui o seu rumo e o Homem o reverteu. Nas grandes megalópoles, o ser humano é um elemento decisivo, e de outro lado estão a flora e a fauna totalmente degradadas. Tem que englobar tudo isso. Penso que, sem a Ecologia Humana, nem a Ecologia Biológica sobreviverá. Se a gente não pode mais pensar pela emoção, vamos para a Ecologia Humana, a parte econômica, mental, lógica, global da Ecologia.

Aldeia - E como o Homem pode interferir novamente agora para voltar, senão a um equilíbrio, o mais próximo possível disso?

Abellá - Difícil, porque existe uma determinante maior que esta lógica que nós conquistamos, que é a dialética cósmica. Vimos o fim de várias civilizações, como a grega, a romana, a egípcia, só que agora isso não se restringirá a uma região. Eu estou convencido de que estamos no fim da nossa civilização. Vai chagar um momento em que, por saturação da dialética, a situação vai se reverter, vai haver um ressurgimento. Você observa em qualquer parte, qualquer fração, qualquer coisa que parece insignificante, como se dá uma unificação no ritmo descendente. Aquilo a que chamamos de progresso tem desenvolvido meios, mas não finalidades. Nós perdemos as finalidades. O progresso quer dinheiro, poder, tecnologia, que são os substantivos de nossa civilização atual. Mas não são finalidades. São simples meios, e nós navegamos para o vácuo. E você vê que os países mais desenvolvidos são os que mais exaltam esse caminho, os que mais se suicidam, porque na frente tem o vácuo que não tem sentido ou explicação. Das várias linhas de decadência, alguma pode ser a máxima, para fazer a humanidade refletir e retomar o desenvolvimento.

Aldeia - E quando chegarmos a esse ponto, teremos tempo de refazer essa história?

Abellá - Esta é a preocupação. Temos que chegar até onde exista retorno. Durante um grande período da história humana, houve retorno. Eu tento enxergar onde está a próxima ruptura do ser humano em sua relação com o meio ambiente, de uma sustentabilidade que realmente preza o Homem como parte do ecossistema. Enquanto caçador e coletor, ele era parte do meio ambiente, e era parte dessa reciclagem natural. Quando começou a construir os ambientes começou a haver uma ruptura, com a criação da agricultura aumentou o desequilíbrio ambiental. Hoje temos essa contraposição entre ambiente natural e ambiente construído. Cabe a nós questionarmos qual é, afinal, o papel do ser humano no ecossistema e para onde nós queremos ir.

Aldeia - O senhor vê a possibilidade de uma conscientização do ser humano no sentido de tentar reaver uma maior integração com o meio ambiente?

Abellá - Em primeiro lugar, a quantidade sempre foi inimiga da qualidade, e a pior poluição é a poluição humana. É como aquela experiência com ratos, na qual colocaram 50 ratinhos numa gaiola e 100 em outra, e aqueles que estavam em maior quantidade se eliminaram rapidamente. Uns poucos povos ficaram ricos, e o que cresce é a massa pobre na Terra. Está errado tudo isso, é uma condenação da espécie e de todo esse sistema. Então, temos que nos conscientizar a respeito da reprodução da espécie, dar mais atenção ao desenvolvimento espiritual também, já que o ser humano é um binômio espírito-matéria, e nossa civilização é muito materialista e aí ela trai a espécie, que é espiritual. Se você não respeita o desenvolvimento integral, se você resolve os problemas apenas parcialmente e não globalmente, acontece isso, a bomba atômica, outros meio de extermínio massivo, biológicos e climatólógicos. Nas grandes cidades acontece a mesma coisa. Basta ver São Paulo com todos os seus dramas.

Aldeia - O senhor acha que ainda existe um movimento ambiental, ou as pessoas estão isoladas, cada uma olhando para o próprio umbigo?

Abellá - Por um lado existe um pouco de fisiologismo, como em toda a parte, em toda a história, e de outra existe o dinheiro, distraidor, que desvia. Muitas entidades, por exemplo, receberam dinheiro de fora e traíram seus financiadores, porque não cumpriram seus compromissos, desonraram o movimento. Por uma coisa ou outra, aos poucos, se perdeu a emoção da rua, que é o combustível do movimento. A emoção se perdeu. A mídia também se deslumbrou no começo, e hoje manifesta-se apenas quando ocorrem grandes tragédias. A mídia é um elemento decisivo, mas também muito corruptor.

Aldeia - O senhor já disse que ainda estaria disposto a trabalhar para que a questão da Ecologia Humana e Urbana tivesse um mínimo de organização. Também disse que isso depende da intervenção de pessoas, não vai surgir de um movimento espontâneo. Como chegar nesses ecologistas, ambientalistas e formadores de opinião, que acabam por achar que os problemas são tão grandes, tão violentos, que ficam imobilizados?

Abellá - Eu comentei isso em um seminário. A teoria cansa e condena o movimento. Por isso, temos que atrelar a teoria à ações imediatas. Propus: vamos tratar desses assuntos, sim, mas porque não reurbanizarmos o Parque D. Pedro? Combinamos, e passou o tempo, e hoje está assim... A ação é fundamental. Mas como fazer isso? Eu acabei de entrar em um movimento que se chama Câmara Júnior Internacional. Dizem que é muito importante, participaram dele John Kennedy, Hiroito, o imperador do Japão, só entram pessoas de 14 a 40 anos. Eu entrei porque tem os que passam, e os poucos que passam são considerados eméritos. Eu propus arborizar São Paulo. Enquanto a OMS recomenda 12 metros quadrados de verde por habitante, aqui em São Paulo foram encontrados 4 metros, e a ritmo decrescente. Temos que reverter esse quadro. Na Assembléia Legislativa, se propôs para este ano um fórum sobre cidadania e meio ambiente. A ONU estabeleceu para este ano o cultivo da paz. Ecologia e paz. Paz com a natureza e paz com os homens é a mesma coisa. São desdobramentos que refletem uma mesma causa. Tudo isso são convergências. Estamos tentando engatar, coordenar, juntar tudo isso.

Aldeia - Não te parece que as ong's acabaram virando ilhas de pensamento ecológico ou mesmo empresarial, que não se preocupam em estabelecer alianças, enquanto a prática da ação ecológica é uma ação de solidariedade?

Abellá - Temos que ver a questão da Ecologia como algo que vai muito além das ong's. Ela deve ser uma preocupação que permeia toda a sociedade. Existem muitas entidades, correntes e instituições que ainda não foram cooptadas, encampadas, como as igrejas. Eu já preguei até que o assunto da Ecologia é tão profundo que é próprio de artistas e de intelectuais, por isso a gente criou o MAPE - Movimento Arte e Pensamento Ecológico. Porque a base de efeito multiplicador cada um deles tem. O artista tem conceitos, a sensibilidade. Um escritor, tem uma maneira de perceber as coisas, de expressar. O artista percebe, o intelectual percebe e entende. Então, bem focadas e sincronizadas essas coisas, quem sabe senão se poderia deflagrar esse processo, aos pouquinhos, sem impaciência, sem pretensão, sem nervosismo? A gente deveria conduzir mais o movimento pela parte espiritual, e não mecanicista, econômica, parcial, transitória. Eu acredito que esse processo vai vir, e talvez privilegiadamente no Brasil. Eu estou no Brasil porque é um país humanista, pacifista e espiritualista, como eu me sinto. Temos essas condições aqui, que podem vir a deflagrar uma verdadeira revolução na regeneração de tudo isso que está aí. Sou otimista, porque, apesar dessas épocas que são como epidemias, de uma ditadura sangrenta como são as ditaduras, e de uma democracia incompetente e corrupta, apesar disso, há um substrato aqui no Brasil, tem espiritualidade. Temos frustrações por todas a parte, mas nada ensina tanto quanto a dor. O ser humano não pode se negar a lutar, não pode se suicidar. Temos que encontrar uma saída, temos que fazer esse esforço.

Aldeia - E o museu da Ecologia, qual é a sua proposta? Ele já existe fisicamente?

Abellá - Todos os anos se perdem milhares de espécies por ano, sem registro. Pode ser uma coisa dessas? Se está empobrecendo a Terra. Qualquer dia vamos ter carências na saúde, porque faltou o remédio. Só a Ecologia Humana pode pensar nessas questões. Queremos partir do microcosmo e ir para os motivos da degradação humana. E, para fazer o Museu da Ecologia, o Brasil tem mais material que a Europa inteira. É uma obra grandiosa, e nós não vamos fazê-lo senão tivermos os quadros mais competentes em cada área. Para acelerar esse processo, estamos criando o Museu Virtual. Talvez o que não conseguimos de dentro para fora consigamos de fora para dentro. Nossa proposta é um museu global, transcendental. Queremos um museu descentralizado: aqui está o museu indigenista, aqui está o museu científico, aqui o museu da arte, aqui o dos insetos... Não vai ser um museu estático, vai ser dinâmico, alegre, aberto, mas extroverso que introverso, um museu da rua, uma antítese dos museus até agora.

*Francisco da Silva é coordenador da Regional São Paulo de Abrosco - Associação Brasileira das Comunidades Alternativas, e Nelson Pedroso é presidente da AGDS - Associação Global de Desenvolvimento Sustentável.

Fonte:


José Antônio Lutzenberger, (Porto Alegre, 17 de dezembro de 1926 a 14 de maio de 2002), foi um agrônomo e ecologista brasileiro que participou ativamente na luta pela conservação e preservação ambiental. Na obra "Fim do Futuro: Manifesto Ecológico Brasileiro", que lançou em 1980, já previa o problema do aquecimento global (hoje um consenso científico, mas na época um assunto desconhecido da população), alertando por exemplo que "a Amazônia não é o pulmão do planeta, é o ar condicionado do planeta".

Crédito da foto: Jurandir Silveira

Por sua representatividade como liderança social, foi convidado e tomou posse como secretário-especial do Meio Ambiente da Presidência da República de 1990 a 1992, quando se demitiu do cargo, desiludido com a burocracia e os jogos de poder e disputa de interesses em Brasília.

Era filho do artista plástico, arquiteto e professor teuto-brasileiro Joseph Franz Seraph Lutzenberger. Formado em Agronomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Lutzenberger trabalhou durante muito tempo para empresas que produzem adubos químicos, no Brasil e no exterior.

Em 1971, depois de treze anos como executivo da Basf, abandonou a carreira para denunciar o uso indiscriminado de agrotóxicos nas lavouras do Rio Grande do Sul. A partir de então se dedicou à natureza e defendeu o desenvolvimento sustentável na agricultura e o uso dos recursos renováveis, alertando para os perigos do modelo de globalização em vigor.

Participou de mais de oitenta encontros nacionais e mais de quarenta internacionais. Entre os quarenta prêmios que recebeu está o The Right Livelihood Award (Nobel Alternativo), 25 distinções e inúmeras homenagens especiais.

Participou da fundação da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN) - uma das entidades ambientalistas mais antigas do país - e criou a Fundação Gaia. Lutz, como era conhecido, escreveu diversos livros, dos quais um dos mais notáveis é Fim do futuro? - Manifesto Ecológico Brasileiro, de 1976.

Coordenou também os estudos ecológicos do Plano Diretor do Delta do Jacuí (RS), tendo papel importante na implantação do Parque Municipal do Lami, em Porto Alegre, (que hoje leva seu nome), e do Parque Estadual da Guarita, em Torres, entre outras atividades.

Em março de 1990, foi nomeado secretário-especial do Meio Ambiente da Presidência da República, em Brasília, durante o governo de Fernando Collor de Mello, onde permaneceu até 1992.

Nesse período, teve papel decisivo na demarcação das terras indígenas, em especial a dos índios Yanomami, em Roraima, na decisão do Brasil de abandonar a bomba atômica, na assinatura do Tratado da Antártida, na Convenção das Baleias e na participação das conferências preparatórias da Conferência Mundial do Ambiente, a Rio-92.

Lutzenberger faleceu em 2002, com 75 anos. Ele foi sepultado do jeito que desejou, nu, envolto em um lençol de linho, sem caixão, ou seja, sem deixar impactos ao ambiente, de forma coerente com sua vida. Seu sepulcro está próximo a uma árvore, em um bosque do Rincão Gaia, em Pantano Grande.

Fundação Gaia

Localizada em Pantano Grande (RS), a fundação atua na área de educação ambiental e na promoção de tecnologias socialmente compatíveis, tais como a agricultura regenerativa (ecológica), manejo sustentável dos recursos naturais, medicina natural, produção descentralizada de energia e saneamento alternativo.

A sede rural leva o nome de Rincão Gaia, área de 30 hectares situada sobre uma antiga jazida de basalto, e que se tornou exemplo de recuperação de áreas degradadas.

O lugar é habitado por diversas espécies silvestres, como a jaçanã, o martim-pescador, o ratão-do-banhado, a lontra, a coruja-das-torres, e outras espécies animais. Além disso, lá funciona o centro de educação ambiental e de divulgação da agricultura regenerativa.


O RECONHECIMENTO DO TRABALHO

José Lutzenberger recebeu ao logo de sua vida mais de 40 prêmios e cerca de 10 homenagens especiais. Veja a seguir algumas delas.

• "Destaque do Ano em Defesa do Meio-Ambiente em 1973", Rede Brasil de Comunicações, Porto Alegre Country Club, 08 de março de 1974;

• Mérito Agronômico DE 1980, concedido pela Federação das Associações de Engenheiros Agrônomos do Brasil - FAEAB;

• Medalha Bodo-Manstein 1981, conferido pela Liga Para o Meio Ambiente e Proteção da Natureza da Alemanha Ocidental em Worms, no Reno - Alemanha, 17 de maio de 1981;

• Prêmio Especial do Júri - Categoria Ecologia - do Prêmio Lei Sarney a Cultura Brasileira 2a. Edição, em 04 de novembro de 1988, no auditório do Palácio Bandeirantes - SP, promoção do Banco do Brasil S/A;

• The Right Livelihood Award de 1988, conhecido como "Prêmio Nobel Alternativo", em Estocolmo - Suécia, no dia 09 de dezembro de 1988;

• Nomeado Integrante da Ordem do Ponche Verde, no grau de Oficial, pelo então Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Sr. Pedro Simon, em 22 de dezembro de 1988;

• Comenda "Augusto Ruschi", conferida pelo Poder Executivo de Cachoeiro do Itapemirim - ES, em 28 de março de 1989;

• Prêmio Internacional "Vida Sana", 1990, Barcelona, Espanha;

• Nomeado Grande Oficial da Ordem de Rio Branco pelo então Presidente da República Federativa do Brasil, Sr. Fernando Collor de Mello, em 23 de maio de 1990;

• Nomeado Comendador de La Ordem del Condor de Los Andes, pelo então Presidente da República de Bolívia, Sr. Jaime Paz Zamora, em 10 de agosto de 1990;

• Nomeado Doctor Honoris Causa pela Universidade de São Francisco, Bragança Paulista, IV/1991;

• Nomeado Grande Oficial da Ordem do Mérito Brasília, pelo então Governador do Distrito Federal, Sr. Joaquim Domingos Roriz, em 21 de abril de 1991;

• Nomeado Grande Ufficiale Dell’ Ordine Al Merito Della Republica Italiana, pelo então Presidente della Repubblica Italiana, Sr. Francesco Cossiga, em 11 de dezembro de 1991;

• Nomeado Conselheiro Principal da Fundação Brasileira Para o Desenvolvimento Sustentável - FBDS, em 1992;

• Member of The Scientific Board da UTEC-ABSORGA - Viena, Áustria - 1994;

• Nomeado Doctor Honoris Causa da Universität Für Bodenkultur Wien, Viena, Áustria, em 21 de março de 1995;

• Homenageado com o título Brava Gente - Embaixadores do Rio Grande do Sul, pelo Governo de Estado, entregue pelo Governador Antônio Britto, em 18 de outubro de 1996.

• Nomeado Professor Honoris Causa, pela Universidade de Shandong, Província de Jinan, na República Popular da China, em maio de 2000.


Algumas obras lançadas por José Lutzenberger;

- "Fim do Futuro?" Manifesto Ecológico Brasileiro
1976, Ed. Movimento, 4ª. Ed. 98 págs.

- "Pesadelo Atômico"
1980, Ched Editorial, 1ª. Ed. 82 págs.

- "Ecologia - Do Jardim ao Poder"
1985, L&PM Editores, Coleção Universidade Livre, 10a. Ed. 102 págs. - 11ª. Ed. Revisada e Ampliada - 192 págs. 1992.

- "Política e Meio Ambiente",
Co-autoria com Flávio Lewgoy e outros, 1986, Mercado Aberto, Série Tempo de Pensar, 1ª. Ed. 115 págs.

- "Giftge Ernte - Tödlicher Irrweg der Agrarchemie, Beispiel: Brasilien"
Co-autor: Michael Schwartzkopff, Eggenkamp Verlag, Greven 1988, 312 págs.

- "Gaia - O Planeta Vivo (Por um Caminho Suave)"
1991, L&PM Editores, 2ª. Ed. 112 págs.

- "Knowledge And Wisdom Must Come Back Together" 
Publicado em 1994 pela Folkuniversitet da Suécia em forma de livreto. 32 págs.

- "Wir Können Die Natur Nicht Verbessern: Reden und Aufsätze des brasilianischen Ökologen/José Lutzenberger"
Edition Siegfried Pater Bonn, 1996, 76 págs.




Chico Mendes

Estou estreando uma nova seção do blog, que chamo de Grandes Ecologistas. Tentarei postar toda segunda-feira. Começo, claro, com Chico Mendes, aquele que deveria ter ficado com três Nobéis da Paz seguidos, e não os vendedores de armas de destruição em massa Obama, Carter e Al Gore. Essa biografia tirei do site do Instituto Chico Mendes.

Não consegui encontrar o autor dessa foto, mas a fonte de onde retirei está devidamente citada.

Biografia de 
Francisco Alves Mendes Filho “Chico Mendes”

44 anos antes de Chico Mendes nascer, no Acre, já existiam conflitos de terra. A área que hoje é o estado do Acre foi disputada num confronto armado entre Bolívia e Brasil, os seringueiros por fim, comandado por Plácido de castro, retiraram os 15 milhões de hectares das mãos dos bolivianos. O tratado de Petrópolis, de 1903 deu a posse definitiva do Acre ao Brasil. Os seringais tornaram rica a região do Acre. A riqueza da borracha atraiu muitos nordestinos á região. Um deles foi o avô de Chico Mendes. As famílias que se mudaram do Ceará para a Amazônia tiveram de se adaptar a um meio ambiente totalmente diferente. Úmida, escura e fechada a Amazônia era uma selva de insetos, doenças que se propagavam. Não havia escolas e nem hospitais. Embora o Brasil estivesse ganhando milhões de dólares com imposto sobre a extração da borracha, o governo não reaplicava um centavo na região da Amazônia. Todos os aspectos da vida representavam, então, um novo desafio. As Famílias ficaram dispersas pela floresta, muitas vezes separadas por quatro ou cinco horas de caminhada. Toda família caçava e colhia na floresta o que não podia plantar comprava dos caixeiros-viajantes.

Em 1944, nasce no seringal Porto Rico em Xapuri – Acre - Francisco “Chico” Alves Mendes Filho. Aos nove anos, Chico Mendes já acompanhava seu pai na floresta; Aos onze tornou-se seringueiro em tempo integral, nesta mesma época, a família mudou-se para a colocação Pote Seco no seringal Equador próximo à cachoeira, durante o dia Chico cortava seringa, caçava e a noite Chico lia alguns livros e se inteirava das noticias através de jornais quase sempre com atraso de semanas. Com doze anos Chico Mendes conheceu Euclides Fernandes Távora, aliado de Carlos Prestes. Euclides havia participado da intentona comunista em 1935, preso, conseguiu fugir e escondeu-se no meio da floresta Amazônica perto da colocação dos Mendes. Foi com Euclides Távora que Chico começou a entender o significado da exploração dos seringueiros, a luta de classes sempre com referencias a Lênin e Marx.

As aulas de Távora tiveram uma interrupção quando Chico estava com 17 anos e teve que trabalhar horas extras para sustentar sua família, pois sua mãe e irmão mais velho morreram. O aprendizado político de Chico com Távora foi retomado nos anos seguintes, Távora conseguiu um rádio, onde juntos Távora e Chico Mendes ouviam os noticiários em português da central de Moscou, BBC de Londres e Voz da América. Analisando os fatos e as noticias, Távora infundia em Chico a consciência da geopolítica e o lugar do Brasil no jogo de tração entre comunismo e capitalismo. Com Távora, Chico aprendeu não apenas a ler em jornais, mas também a pensar e recolher elementos para compreender o país e a condição dos seringueiros. E foi assim que teve inicio, embora isoladamente, um trabalho incessante de conseguir a autonomia dos seringueiros.

Com a chegada do movimento sindical ao Acre por volta de 1974, Chico encontrou um aliado forte para organizar as bases, difundir suas idéias e fortalecer o movimento. Chico Participou do primeiro curso da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), em 1975, sobre os direitos da terra e organização sindical, onde causou forte impressão, pois estava a um nível bem superior a outros trabalhadores, pois além de ler e escrever bem, conhecia os fundamentos da filosofia sindical.


A igreja católica teve importante papel na trajetória de Chico Mendes, foi militando nas comunidades eclesiais de base que Chico cultivou lideranças e um combativo senso de propósito entre os isolados habitantes da floresta.

A ocupação intensiva gerenciada pelo governo na Amazônia na década de setenta atingi também o Acre. Agricultores e pecuaristas oriundos do sul do país chegam ao Acre para explorar a terra, substituindo os seringais, derrubando a floresta para a implantação de fazendas de gado. Como conseqüência das derrubadas, 10 mil famílias de seringueiros sem trabalho acabaram por virar favelado nas periferias de Rio Branco, capital do Acre, ou na Bolívia.

Conforme crescia a especulação das terras no Acre no final dos anos setenta, os trabalhadores começaram a se organizar para a tarefa de impedir os cortes.

Chico Mendes agora passa a ser visto quase sempre nas estradas da floresta, recrutando os seringueiros a se sindicalizarem e participarem dos empates. Nos empates, os seringueiros, acompanhados de mulheres e crianças, colocavam-se entre as árvores e os tratores e motosserras para impedir a destruição das florestas do Acre.

No inicio Chico encontrou dificuldade em convencer as pessoas a se sindicalizarem, por que os fazendeiros espalharam rumores de que a operação possuía uma inspiração comunista; Mas as comunidades de base deram-lhe uma estrutura e ele acabou por encontrar pessoas conscientes de seus direitos básicos e da possibilidade de determinar seu próprio destino. Chico participou ativamente da implantação do Projeto seringueiro, onde consistia na construção de escolas nos seringais para alfabetizar os seringueiros e, utilizando uma metodologia inovadora, conscientizá-los dos seus direitos.

A convite de um comerciante da Cachoeira, Guilherme Zaire, Chico Mendes sai candidato a vereador em Xapuri pelo MDB, no ano de 1977; No começo, os líderes sindicais rejeitam a idéia, mas Chico acabou por convencê-los de que seria mais fácil criar o sindicato rural em Xapuri se ele fosse vereador. Chico foi eleito a vereador e, logo depois, foi fundado o novo sindicato dos trabalhadores rurais em xapuri.

Chico Mendes dedicava agora todo seu tempo na organização dos seringueiros para o 1º encontro nacional, a comunidade internacional enfim começava a se sensibilizar e se articular para exigir do governo brasileiro uma postura mais rígida com relação às queimadas e desmatamentos na Amazônia. O conflito entre os dois modelos de desenvolvimento, um baseado na pecuária extensiva e outro baseado no extrativismo dos recursos florestais parecia que caminhava para um desfecho de entendimento entre as partes. Chico Mendes era figura mais atuante no movimento sindical e ambientalista. Porém Chico acreditava que uma atuação político-partidária seria uma forma de fortalecer o movimento e garantir as melhorias para os seringueiros. Depois de uma passagem mal sucedida pelo MDB, Chico Mendes ingressa no Partido dos Trabalhadores, tornando-se um dos fundadores do partido no Acre. Amigo pessoal do até então deputado federal por São Paulo, Luis Inácio Lula da Silva, Chico conseguiu projeção na esquerda brasileira, fato que o credenciou a candidatar-se a deputado estadual no Acre pelo partido dos trabalhadores e mais tarde a prefeito de Xapuri pelo mesmo partido sendo derrotado nas duas oportunidades.

Todavia Chico Mendes não se sentiu derrotado; Ele não estava sozinho. Com seu discurso cativante e o respaldo de quem viverá os últimos 12 anos na mobilização e criação de sindicatos rurais e movimentos sindicais, Chico conseguiu aliados importantes no Acre e no Brasil. Uma dessas aliadas era Marina Silva então monitora das comunidades eclesiais de base da igreja católica. Era constante ver Chico e Marina pelos seringais do Acre, num esforço pelo fortalecimento das escolas rurais e do projeto seringueiro; Eles visitavam as escolas e falavam aos seringueiros da necessidade de resistir às investidas, cada vez mais constantes e violentas, dos pecuaristas na região. As conquistas alcançadas pelo movimento dos seringueiros tendo a frente Chico Mendes dominavam o cenário político-ambiental na Europa, nos Estados Unidos e no Sudeste brasileiro.

Em Outubro de 1985, Chico Mendes e outras lideranças, com o apoio da antropóloga Mary Allegretti organizaram o 1º Encontro Nacional dos Seringueiros, onde formularam a idéia das reservas extrativistas, como forma de resguardar os direitos dos seringueiros sobre a floresta.
A partir do encontro nacional, a luta de Chico Mendes pela preservação do modo de vida dos seringueiros e conservação da floresta amazônica, chamou a atenção do mundo. Tanto que em Julho de 1987 Chico Mendes recebe o prêmio global 500, concedido pela ONU às personalidades que mais se destacaram na defesa do meio ambiente. Além da medalha Sociedade para um mundo melhor e outros no Brasil e exterior.

Ao final dos anos 80, Xapuri cheirava a pólvora, os conflitos pela posse da terra entre seringueiros e pecuaristas chegavam então ao seu ápice, as ameaças a Chico Mendes já eram constantes e na noite do dia 22 de dezembro de 1988 sete dias após ter completado 44 anos, ao sair para tomar banho em sua humilde casa Chico é alvejado com um tiro no peito na presença de sua esposa Ilzamar e de seus filhos Elenira e Sandino. Seu sangue foi derramado na terra e floresce nos corações dos que ainda sonham com a preservação da Amazônia.

“Se descesse um enviado dos céus e me garantisse que minha morte iria fortalecer nossa luta até que valeria a pena. Mas a experiência nos ensina o contrário Então eu quero viver.”
Ato público e enterro numeroso não salvarão a Amazônia.
Chico Mendes em entrevista 1988.

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